1 de fev de 2016
A “Guerra Fiscal” vivenciada entre os Estados da República Federativa do Brasil está a receber novos contornos no que diz respeito à venda de produtos pela internet, chamado e-commerce.
Como é ressabido, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 conferiu aos Estados a competência de instituir o imposto sobre as operações relativas à circulação de mercadoria, e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
O constituinte estabeleceu diversas regras na própria Carta Magna a fim de tentar evitar a famosa guerra fiscal, bem como para distribuir a tributação entre todos os entes da maneira mais equânime possível, levando em consideração, inclusive, a situação econômica dos Estados, uma vez que os menos desenvolvidos, como os do Nordeste, recebem uma fatia maior destes recursos.
Neste interim, no que diz respeito às vendas realizadas, em que os integrantes da relação de consumo estejam estabelecidos em Estados diversos, o inciso VI, do §2º do art. 155 da Constituição da República estabelece que as alíquotas internas referentes às operações de circulação de mercadoria não podem ser inferiores à alíquota interestadual, o que tenta prevenir a guerra fiscal entre os Estados e ainda garante aos mesmos uma parte da arrecadação.
Assim, no que tange a seguinte forma de recolhimento/distribuição do ICMS nas operações interestaduais, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabelece que o Estado produtor terá direito a receber o valor referente à alíquota interestadual, já o Estado em que o bem será consumido irá receber a diferença resultante de sua alíquota interna e a interestadual, conforme dispõe a aliena “A” do inciso VII c/c com o inciso VII, ambos do §2º do art. 155 da Constituição da Republica Federativa do Brasil.
Antes da EC nº 87/2015, as compras realizadas pela internet eram consideradas como se estivessem sendo concretizadas no estabelecimento do vendedor, com o que a tributação é devida somente ao Estado de origem.
Todavia, o avanço tecnológico, impensável em 1988, trouxe modificações consideráveis nas relações comerciais, pois no caso, a internet interligou povos em distâncias inimagináveis com um único click no mouse.
Neste novo universo de possibilidades trazidas pela internet, iniciou uma nova forma de adquirir produtos sem ter o contato pessoal com o mesmo, somente por meio da visualização de uma foto. É possível procurar qualquer tipo de mercadoria que esteja precisando e comprar sem sair do conforto de sua casa e ainda a qualquer hora do dia ou da noite, recebendo o produto em sua residência.
Por oportuno, para se ter uma ideia do crescimento repentino e avassalador da internet no Brasil, de acordo com o estudo coordenado por Luzia Maria Mazzeo, e pesquisado pela Sônia Pantoja e Rosângela Ferreira, com edição visual de Sônia Pantoja, intitulado de “Evolução da Internet no Brasil e no Mundo”, em 1995 havia 250 mil (duzentos e cinquenta mil) usuários de internet. Já em 1999 (apenas quatro anos depois) chegou a haver 4 milhões (quatro milhões) de usuários. No segundo trimestre de 2011, conforme noticiado pelo IBOPE , a internet chegou a 77.800.000 (setenta e sete milhões e oitocentos mil) pessoas. Destaca-se ainda que, segundo o site Brasil Econômico, 91% dos brasileiros que acessam a internet realizam compras utilizando-a.
Essa nova modalidade de compra, o chamado e-commerce, a princípio seria inofensivo ao pacto federativo, tendo em vista se tratar somente de compras realizadas por cidadãos que em nada iria interferir na harmonia entre os Estados. Ledo engano, tamanho é o volume de compras realizadas na internet, entre consumidores domiciliados em Estados diversos dos estabelecimentos, que claramente afetou a harmonia dos mesmos, ocorrendo assim uma “Guerra Fiscal”. Segundo a E-Bit, empresa especializada em informações sobre comercio eletrônico, o seguimento registrou faturamento de R$16 bilhões no primeiro semestre de 2014 (01).
Essa “Guerra Fiscal” ocorria pois as empresas que realizam a venda de produtos pela internet se concentram em poucos Estados, em suma os mais desenvolvidos e industrializados. Assim, os Estados que possuíam menores índices de industrialização acabavam vendo uma possível arrecadação de tributos (o consumo de seus cidadãos), indo para outros Estados, uma vez que atualmente não recebem nenhuma fatia da tributação proveniente das compras realizadas pela internet.
Assim, os Estados membros mais prejudicados levaram a discussão para o CONFAZ, utilizando como fundamento o acordo entabulado para os casos de venda de automóveis pela internet, mas não lograram êxito.
Face à latente “Guerra Fiscal”, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional nº 85/2015, para solucionar a celeuma.
– 2015: 20% para o Estado de destino e 80% para o Estado de origem;
– 2016: 40% para o Estado de destino e 60% para o Estado de origem;
– 2017: 60% para o Estado de destino e 40% para o Estado de origem;
– 2018: 80% para o Estado de destino e 20% para o Estado de origem;
– a partir de 2019: 100% para o Estado de destino.
Os Estados já delimitaram as novas regras que devem ser observadas pelas Empresas que realizam operações interestaduais destinadas a consumidor final, através do Convênio ICMS nº 93/2015. Dentre outras normas, destaca-se a escrituração que deverá observar os Ajustes SINIEF nº 12/2015 que instituiu uma nova obrigação acessória, a “declaração de substituição tributária, diferencial de alíquota e antecipação” (DeSTDA), que deverá ser entregue mensalmente, em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2016.
As empresas optantes pelo Simples Nacional também devem observar as regras constantes no Convenio ICMS nº 93/2015, no que diz respeito ao imposto devido à unidade federada de destino. Fato que irá majorar seus custos, uma vez que deverão contratar profissionais capacitados para analisar todas as legislações estaduais, face a necessidade de apurar as obrigações vigentes no Estado de destino.
*Artigo publicado no site Reuters Brasil, de autoria do advogado da Fecomércio MG Marcelo Morais.