19 de nov de 2020
* Guilherme Almeida, economista-chefe da Fecomércio MG
Pouco mais de 30 anos. Foi o que precisou o Senado para aprovar, por 56 votos a 12, um projeto que, dentre outras matérias, provê autonomia ao Banco Central do Brasil (Bacen). O tema, votado no início de novembro, foi deixado de lado por muito tempo. Embora bastante discutida no campo teórico, a medida só voltou à tona por fazer parte das propostas do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Em geral, Bancos Centrais possuem o objetivo primário de manter a estabilidade dos preços na economia. Por vezes, essa busca pode ser influenciada por ingerências políticas, enviesando a condução da política monetária. Nesse sentido, surge a ideia de autonomia da autoridade monetária, não tão liberal quanto à independência, mas que garante mais credibilidade na condução das ações.
Há diversas fundamentações teóricas acerca do assunto, com destaque para duas ideias. A primeira se baseia no viés inflacionário decorrente da falta de credibilidade de uma política monetária voltada à estabilidade de preços. Esse descrédito advém da busca de inúmeros objetivos que, não raro, podem esbarrar nesse propósito. Desta forma, a delegação da política monetária a um Banco Central autônomo visa solidificar a credibilidade, intensificando o controle da inflação de forma a manter o produto e a taxa de desemprego próximos da tendência de longo prazo.
A segunda teoria está amparada na flutuação econômica decorrente dos ciclos econômico e político. Nesse escopo, a delegação da política monetária a uma autoridade autônoma visa reduzir a influência política e, desta forma, amenizar a flutuação econômica.
A credibilidade, neste caso, tem papel fundamental nessa retórica. Sua ausência acarreta maior custo para manter a inflação baixa ou reduzi-la, caso esteja em altos patamares. Esse custo mede, basicamente, a perda produtiva ou a taxa de desemprego decorrente da política monetária para o controle inflacionário. Nesse cenário, se os agentes econômicos não creem na condução da política pelo Bacen, as expectativas de inflação se deterioram, estimulando uma política mais restritiva.
Como o tema colocado em votação foi a autonomia operacional do Banco Central, o governo – por meio, principalmente, do Conselho Monetário Nacional (CMN) – continuará definindo as regras da política monetária do país. Com isso, restará à autoridade monetária a escolha dos instrumentos a serem utilizados para atingir os alvos estabelecidos pela equipe econômica.
O dispositivo aprovado também destaca a ampliação dos objetivos da instituição. Para além do target oficial de controle inflacionário, o Bacen deve buscar a suavização das flutuações do nível de atividade econômica, zelar pela solidez e eficiência do Sistema Financeiro Nacional e estimular o pleno emprego. Essa ampliação é vista, em parte, com bons olhos, pois sua autonomia pode levar à excessiva valorização do controle da inflação e, por consequência, a custos desnecessários em termos de produção e à elevação da taxa de desemprego.
O projeto de lei ainda será votado pela Câmara dos Deputados. No entanto, já é possível afirmar: a credibilidade da política monetária proporcionada pela autonomia do Banco Central permitirá ao país atingir mais estabilidade de preços e mitigar os efeitos negativos dos choques econômicos sobre a produção e o desemprego.
* Artigo publicado no Diário do Comércio